domingo, 29 de abril de 2012

Ensaio Sobre a Preguiça

A Preguiça é a mãe de todos uns negócios aí que agora eu realmente não lembro. Seria o quê, de todos os filhos da puta? Não, nada tão incisivamente autocrítico. Eu sei que ela é mãe de todos os qualquer coisa, que tanto podem ser suplentes de deputados do DEM quanto, sei lá, bichinhos. Não sei se faz sentido, mas soa bem: os bichinhos também são filhos da Preguiça. Daí os bichos-preguiça. Pode ser. Realmente não lembro.


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Dizem que a Preguiça mata. Logo, além de mãe ela também é assassina. Temos então que a preguiça é uma espécie de Ma Barker, com a cara da Shelley Winters, empunhando uma metranca fumegante e mascando um charuto apagado. E as manchetes: “Preguiça mata vinte e oito durante missa do Papa na Praça de São Pedro”. “Catorze mortos pela Preguiça durante gravação de um programa de entrevistas no Canal Futura”. Vai ver os caras mexeram com os bichinhos de que ela cuida, aí pá. Shelley Winters, você sabe, nunca perdoa.


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Mas tem um detalhe. A Preguiça morre de preguiça de ser associada à malemolência brasileira. “Macunaíma é um personagem um tanto unidimensional, sabe”, disse ela em recente coletiva. “Eu preferia ser literariamente corporificada por uma personagem da Jane Austen. O clima é melhor, as roupas também, e ah, as festas, as festas. Já pensou, Razão, Sensibilidade e Preguiça?” A Penguin Books ficou de pensar no assunto.


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A Preguiça é vilipendiada. A Preguiça tem a imagem distorcida. A Preguiça é a prostituta da Babilônia. A Preguiça sempre tem seu significado intrínseco violentado. A Preguiça é o bode expiatório. A Preguiça é apressadamente apontada como o elemento pernicioso do caráter nacional. A Preguiça é invariavelmente responsabilizada pelo desandar do sistema educional. A Preguiça é tida e havida como a culpada por testemunharmos a orgia institucional em Brasília e não fazermos nada. A Preguiça sempre é acusada de ser a vilã do cenário de imobilidade subtropical. E quer saber? A safada gosta.


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A Preguiça é a mãe de todos os – o quê, o quê? Caramba. Esqueci mesmo. Minha intenção, para fechar o texto, era retomar o tema do primeiro tópico – me lembrando então num estalo de quem a Preguiça é mãe – e arrematar que eu estaria, tcharan!, com preguiça de terminar o texto. Não critiquem, seus filisteus: eu sempre utilizo essa técnica enganadoramente cômoda e previsível para concluir meus posts. Certo ou errado, é mais forte que eu. Aliás, é mais que um maneirismo. Chega a ser vício, puro vício. Mas posso garantir que eu preferiria, ao invés de ficar me safando com estes truquezinhos metalinguísticos tão viciantes, me lembrar logo de quem diabos a Preguiça é mãe. Saco.